Pirataria de software: quais as consequências para sua empresa

Não é de hoje que ouvimos falar sobre investigações envolvendo a pirataria de software. Ações judiciais buscam a responsabilização de empresas que se aproveitam de algum tipo de artifício para uso de softwares que não estão devidamente licenciados.

Sendo assim, o uso indevido de um software, ou até mesmo o uso de um sistema com licença expirada, pode causar diversos prejuízos patrimoniais de reputação e criar vulnerabilidades para ciberataques.

Um caso muito emblemático ocorreu na Justiça do Rio de Janeiro, que autorizou o leilão de um prédio da Universidade Candido Mendes devido a uma dívida correspondente ao processo movido pela Microsoft. A Universidade foi condenada por uso de 270 softwares do Windows pirata, resultando em uma indenização no valor de R$ 42 milhões e um processo que dura cerca de 20 anos.

Ótica legal sobre a proteção do software

Na legislação nacional, os softwares são protegidos e regulados com base da Lei do Software (9609/1998), conjuntamente com a Lei dos Direitos Autorais (9610/1990), uma vez que a Lei dos Softwares equipara programa de computador com obras literárias.

Como funciona a proteção legal de softwares

A Lei do Software também regula a forma de contrato que pode ser estabelecida com a empresa detentora dos direitos do software em relação ao usuário final, constatando que o uso do programa de computador sempre será objeto de contrato de licença.

Se não houver o contrato de licença, o usuário final pode comprovar a aquisição idônea do software por meio de algum documento fiscal (nota fiscal, invoice, fatura, etc) de aquisição ou licenciamento da cópia.

Desta maneira, caso tenha adquirido o software devidamente, a empresa não deve se preocupar com eventuais questionamentos sobre legalidade do software.

O que caracteriza a pirataria de software

A contrafação (ou seja, reprodução/pirataria), utilização e/ou venda de um software sem autorização do detentor do direito deste software pode caracterizar uma violação de direitos autorais.

O uso indevido, por muitas vezes, não é levado em conta. Porém, se o usuário utiliza um sistema de maneira diferente ao seu objetivo, também pode caracterizar a violação do direito autoral. É punível, portanto, igualmente à pirataria. Exemplo:

  • Utilizar-se de uma única licença de software para várias máquinas, de forma não autorizada pelo contrato de licença ou termo de uso do Software;
  • Utilizar-se de uma licença de software com objetivo diferente ao tratado pelo contrato de licença ou termos de uso. Exemplo: Software reservado para uso doméstico (Office Home), mas utilizado por uma empresa (Office Business).
  • Utilizar-se um software com a licença expirada, além do prazo estipulado no contrato de licença ou termo de uso do software.

O resultado da violação pode ser o pagamento de indenizações cíveis e até mesmo condenação penal. A pena de reclusão poderá chegar a quatro anos na forma agravada.

Muitos empresários acreditam que nunca vão ser pegos em caso de uso indevido de software e/ou uso de uma aplicação pirata, mas não é bem por aí.

A investigação por pirataria de software

A Lei do Software e a Lei de Direitos Autorais protegem programadores e titulares de direitos de programas de computadores. Como visto acima, a legislação permite que esses agentes realizem ou implementem instrumentos ou códigos automatizados para detectar o uso indevido de seus softwares.

Ou seja, toda empresa que desenvolve e tem direito de exploração de softwares pode monitorar e correr atrás do prejuízo. Em outras palavras, está liberada para constatar a violação dos direitos autorais. Ao constatar uma simples suspeita, a organização pode agir de duas formas, amigável ou não.

Geralmente, as empresas supostamente infratoras são notificadas diante de cotações não concluídas, denúncias anônimas ou até mesmo após um processo de investigação conduzido de forma autônoma pelos os titulares dos softwares. Há todo um aparato legal disponível e grandes investimentos dos titulares dos softwares. Além disso, associações e organizações governamentais ou não atuam em prol do combate à violação dos direitos dos autores e pirataria de software.

De forma amigável, após a constatação da suspeita de uma violação de direito de autor/pirataria, a empresa de software entra em contato com a empresa suspeita. Por meio de uma notificação, solicita esclarecimentos para que a empresa suspeita possa informar de forma espontânea suas licenças de software ou que faça contato para regularizar seu parque de máquinas. Ou, ainda, faça uma revisão interna e verifique se algo não está licenciado.

Se a empresa suspeita tiver tudo em ordem, poderá apresentar a documentação solicitada por meio de seu inventário de software e evitar qualquer tipo de pagamento de multa ou indenização. Por isso que é muito importante ter todas as informações devidamente organizadas e um controle da gestão, para que seu jurídico possa ser mais ágil na resposta.

Quando a empresa é pega na ilegalidade

Caso a empresa não tenha tudo em ordem e/ou até tenha algum tipo de programa de computador pirata, o aconselhado é sempre falar com seus advogados/corpo jurídico. No intuito de evitar uma judicialização do problema, deve-se iniciar tratativas de conciliação em conjunto com a empresa de software. A abordagem judicial, afinal, é bem desgastante e muitas vezes imbatível.

Na segunda hipótese, a empresa de software detentora do direito autoral pode se valer de mecanismos jurídicos muito eficientes. Como exemplo, podemos citar a propositura de uma ação de antecipação de provas.

Como resultado das suas investigações ou denúncias realizadas pelos canais próprios, a empresa de software identifica suas suspeitas e ingressa com uma ação de antecipação de provas. A mesma, por via de regra, corre em segredo de justiça. Seu objetivo é realizar uma perícia técnica para evidenciar a existência de uso indevido de programas de computador, gerando uma prova robusta que comprove os danos.

Constatado o uso indevido do software, a empresa detentora dos direitos autorais ingressará com uma ação de indenização. Nesta ação, a empresa suspeita poderá se defender por meio de seu advogado. Porém, a prática demonstra que é uma luta bem árdua, dolorosa e cara.

Com o ingresso da ação de indenização pela empresa de software, havendo uma prova muito robusta feita por um perito judicial, a probabilidade de condenação é muito alta. Os elementos de defesa são muito restritos nesta situação.

O valor da indenização

Havendo a condenação, a empresa suspeita passará a ser empresa condenada. Em sede de sentença, o Juiz da ação arbitrará o valor da indenização. Provavelmente condenará reembolso com as despesas das ações com custas, honorários periciais e sucumbenciais em favor da empresa de software detentora dos direitos autorais.

Nesta situação, a indenização poderá ser arbitrada em 10 (dez) vezes o valor de cada software de computador utilizado indevidamente. Existem jurisprudência, precedentes dominantes até mesmo no Superior Tribunal de Justiça. [1] Por esses motivos que as indenizações nestes casos são tão altas.

DIREITO AUTORAL. UTILIZAÇÃO E REPRODUÇÃO DE SOFTWARE SEM LICENÇA.1. Embora a ré somente se utilizasse de mídias originais na instalação dos programas comercializados pela autora, não poderia ter se valido de uma mídia original para reproduzi-la em outras três máquinas, ainda que o uso fosse temporário, como dito, para migração das informações entre os computadores recentemente substituídos. 2. Vale lembrar que o art. 5º, inc. VI, da Lei nº 9.610/98, considera ato ilícito a reprodução de obra, ainda que armazenada temporariamente em meio eletrônico. Assim sendo, o uso transitório de software irregular não tem o condão de afastar a ilicitude da conduta. 3. A regularidade do uso deve ser aferida de acordo com os parâmetros dispostos no art. 9º, da Lei n. 9.609/98; 4. A indenização devida pelo uso irregular do programa de computador deve também compreender a sanção em decorrência da violação ao direito autoral. A sanção é fixada com o objetivo de desestimular a prática ofensiva ao direito autoral. Assim sendo, melhor se ajusta ao caso em exame a fixação de indenização na quantia correspondente a dez vezes o valor médio de mercado de cada programa utilizado irregularmente. [2]

O objetivo da sentença

A condenação tem como objetivo coibir a prática de violação de direitos autorais:

RESPONSABILIDADE CIVIL. DIREITO AUTORAL. PROGRAMA DE COMPUTADOR (SOFTWARE). INDENIZAÇÃO. FIXAÇÃO. PARÂMETROS. -Na hipótese julgada, é razoável supor que não houve a intenção de praticar qualquer espécie de concorrência desleal ou comprometer a indústria legalizada. Os arts.103 e 107 da Lei nº 9.610/98 incidem apenas nas situações de edição fraudulenta da obra. Na hipótese de simples uso de programa sem a respectiva licença, aplica-se a regra do art.102 da Lei nº 9.610/98.- A sanção do parágrafo único do art.103 da Lei nº 9.610/98 tem sua aplicação condicionada à impossibilidade de identificação numérica da contrafação. – A pena pecuniária imposta ao infrator não se encontra restrita ao valor de mercado dos programas apreendidos. Inteligência do art.102 da Lei nº 9.610/98 – “sem prejuízo da indenização cabível”. – A fixação do valor da indenização pela prática da contrafação deve servir, entre outras coisas, para desestimular a prática ofensiva, sem, no entanto, implicar enriquecimento sem causa do titular dos direitos autorais violados. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO. [3]

Após a sentença, ainda haverá prazos legais para eventuais recursos que se perpetuarão no tempo. Não havendo mais possibilidade de recurso, o processo judicial entrará em fase de execução. Isso resultará no pagamento da condenação com as devidas atualizações, aplicações de juros. Ainda é possível chegar ao extremo de penhorar bens da empresa e até mesmo dos sócios, dependendo dos procedimentos seguidos.

Pirataria de software não compensa

Embora os números de pirataria no Brasil ainda sejam alarmantes, dando a entender que o uso indevido é algo normal e banal, o risco para a empresa é muito grande. Basta um simples esquecimento de renovação de uma licença de uso para criar a caracterização de uma violação de direito autoral e ficar sujeito a todos os procedimentos mencionados acima.

Campeões não usam softwares piratas.

[1] Resp 1.185.943 – RS

[2] TJSP. Apelação n. 0021759-31.2010.8.26.0564. Des. Relator Carlos Alberto Garbi, julgado em 12.03.2013

[3] STJ– RESP1136676/ RS


* Escrito por Flávia Victtor dos Anjos, Advogada no Brasil (OAB/SP 321.267) e em Portugal (OA 6049P) com experiência de 8 anos na área de direito digital e empresarial. Coordenadora Adjunta da Comissão de Direito Electrônico da Subsecção de Santo Amaro – Ordem dos Advogados de São Paulo de 2015 até 2018.

Gestão de ativos de TI com o NetEyePirataria de software